26.12.08

DEBAIXO DA FIGUEIRA DE MEU AVÔ

A Jacob Uchôa estava agora em polvorosa. Mal começara a campanha eleitoral de 1955 e já havia dois mortos ainda quentinhos. As mortes ocorreram no espaço de uma semana. Um à bala. O outro a facadas. Um de cada lado. Um de cima e o outro de baixo. Ambos não eram de famílias importantes. Não tinham sobrenome famoso, mas trabalhavam nas casas dos respectivos coronéis e isso, por si só, emprestava ao fato uma aura de seriedade que beirava ao medo, chegando mesmo ao pavor para alguns.

Ambos os enterros foram magnânimos, discursos exaltados pipocaram de um lado e de outro no mesmo calibre, elogiava-se o morto, apontavam os culpados, ainda de forma vaga, e pediam que Deus o recebesse em sua glória infinita. Viúvas e filhos humildes, vestidinhos como bonecos cuja roupa fora feita de última hora, ali do lado daquela gente emplumada. Por quase quinze dias consecutivos as mulheres caridosas que moravam na ruazinha acenderam maços de velas para as almas dos finados. Ninguém foi preso. Todo mundo sabia quem eram os assassinos de um e de outro, mas ninguém era besta de abrir a boca assim se mais nem menos, e correr o risco de ter um fim trágico como os dos capangas assassinados. As pessoas aprendiam desde muito cedo a não verem nada, não falarem nada, não lembrarem de nada. Havia delas que esqueceram o próprio nome.

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