4.7.10

A TOCA DE TIA DOCA (fragmento de um dos próximos livros)


(foto FAPEP)

O telhado tinha telhas da cor de cocada com rapadura alvinha e eram feitas de encomenda como de resto tudo naquela casa. E, claro, todas escolhidas a dedo pelo avô de tia Doca. De Pau d´arco do legítimo eram feitos os frechais e os caibros e as ripas eram de jacarandá.
                       
Boquinha de forno ... Forno!!!
Jacarandá ....Dá!!!
                        Quando eu mandar ...
                        For!!!
                        E se não for?
                        Apanhará!!!!

Os pombos pareciam pequenos tufos de pena se rebolando de um lado para o outro lá na cumeeira parando aqui e ali para limpar o bico, para se coçar, para namorar ou, então, voavam de volta emaranhando-se no espaço azul que permanecia suspenso, esperando por eles.  Por detrás da cumeeira, também, dependendo do dia ou da hora do dia, havia muitos céus: céu azul, céu rosa, céu branco, céu com carneirinhos, céu com nuvem-palha-de-coco, céu com enormes castelos carregados pelo vento, céu com caravanas de camelos que se transformavam logo em elefantes, que se transformavam, dali a pouco, em céu negro, céu salpicado de estrelas onde apareciam anjos que brincavam de atirar estrelinhas e pequenos cometas uns nos outros ou que, simplesmente, ficavam bocejando entre as Três Marias e O Saco de Carvão e a Coroa de Nossa Senhora, o Cruzeiro do Sul e o Sete estrelas. Coisas que o Manelito vivia aprendendo de tanto ler num livro de astronomia que ganhara de seu mui amigo juiz de direito, Dr. Bernardo.

Tia Doca dizia que o avô pensara aquela casa nos mínimos detalhes. Chamava sua obra de Arca de Noé. Mesmo assim, enquanto vida ele teve só ficava hospedado na casa durante o mês de dezembro de cada ano, que era o mês dos festejos da padroeira, Nossa Senhora da Conceição. Certo que, uma vez ou outra, se despregava lá de sua estimada propriedade no interior e vinha bater até cá na casa da cidade, principalmente na época da política. Ou então quando sentia alguma dor aguda e ‘vinha ver Dr. Adail Santana’.

Pois você me acredite, dizia ela para as visitas naquele linguajar de senhora dona da situação, que por ali ele ficava remendando alguma coisa, tapando algum buraco, cuidando dos caibros, das ripas, retocando a tinta das paredes e portas e tudo isso rodeado de netos e sempre muito brincalhão. Mas o mimo mesmo, o cuidado maior do velho era com o Jardim do Éden, que era como ele chamava o pomar da casa, que Dr. Bernardo chamava de Jardim de Monet.



TENDA DA CRUVIANA http://cruvianadepedroii.blogspot.com/

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