17.3.09

Garimpando no filão turístico de Pedro II

Paulo Melo Sousa

A partir de Teresina, o visitante demora três horas e meia para cumprir os 195 km da estrada que liga a capital piauiense ao município de Pedro II, que nasceu com a denominação de Pequizeiro, no final do século XVIII, através da colonização do português João Alves Pereira, que edificou no lugar uma capela consagrada a Nossa Senhora da Conceição, mandando vir de Portugal uma imagem da santa que ainda se encontra no templo. Mais tarde, em 1851, o lugar passou a ser chamado de Freguesia de Nossa Senhora da Conceição dos Matões e, mais tarde, Pedro de Alcântara, já como Vila, homenageando o Imperador do Brasil. Com a Proclamação da República, voltou a se chamar Matões e, em 1891, Itamaraty, já como cidade, em homenagem ao Palácio do Governo. Finalmente, em 1911 voltou a se chamar Pedro II. A colonização portuguesa do município ocorreu em virtude do potencial hídrico ali existente, o que favoreceu a criação de gado. O casario original do século XIX praticamente desapareceu (inclusive a capela de Nossa Senhora da Conceição, hoje substituída por edificação mais recente, datada da década de 50 do século passado), restando apenas exemplares do início do século XX em processo de Tombamento pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, alguns já bem deteriorados. Porém, muitos prédios ainda formam conjuntos arquitetônicos isolados ou enfileirados, o que confere uma harmonia em determinados trechos da cidade, notadamente no entorno de algumas praças. Pedro II possui 37 mil habitantes, com 22 mil pessoas habitando a sede do município.

No meio rural, perdura a agricultura de susbsistência, e a economia gira em torno do artesanato à base de fio de algodão, extração da opala, pedra semipreciosa que projeta a cidade no segmento da mineração, comércio, funcionalismo público e renda de aposentados. O turismo começa a ser explorado como novo filão, pois o município é pródigo em atrativos que favorecem o desenvolvimento do ecoturismo. Mais recentemente, a partir de 2004, o turismo cultural vem ganhando espaço através do Festival de Inverno, atração que tem chamado a atenção do país para a cidade, pois consegue aglutinar um número bastante expressivo de artistas ligados ao jazz e ao blues, principalmente. No ano passado, 16 mil pessoas visitaram a cidade durante o período. Pedro II, cortada pelo rio Corrente, afluente do Poty, está localizada na Serra dos Matões, ao norte do estado, possui clima agradável, com temperatura que, durante a noite, oscila entre 16º e 20º, e apresenta uma altitude de 360 metros em relação ao nível do mar.

Caminhando pelo Centro Histórico, a rua Jacó Uchoa representa o antigo marco divisório político entre as disputas das famílias Nogueira e Mourão. No passado, um partidário de uma das famílias não se arriscava no território da outra, pois a ousadia poderia dar inínio a conflitos. A estória ainda se encontra viva na memória dos pedrossegundenses. Nessa rua, entramos numa loja pertencente à Associação dos Artesãos de Pedro II, que atualmente possui 30 sócios. Ali, a artesã Elziane do Nascimento informa que “a atividade teve início a partir de uma articulação do padre alemão Norberto Herckam, em 1976, que criou, na ocasião, uma Cooperativa, sensibilizado pela precária situação econômica das mulheres da cidade; ele passou a Coordenação da Cooperativa para dona Socorro Benigno, que comandou a mesma até falecer. Desse grupo surgiram várias entidades que hoje agrupam pessoas que trabalham com tecelagem”. Atualmente, segundo cadastramento do SEBRAE, existem 5 mil artesãos no município, 70% dos quais envolvidos com essa atividade, produzindo redes, jogos americanos, caminhos de mesa, mantas, descansa copos e echarpes, dentre outros produtos.

A Associação dos Artesãos fica na esquina da praça Domingos Mourão Filho, na qual acontece uma Feira de Artesanato durante o Festival de Inverno. Num prédio localizado em frente desse mesmo logradouro, funciona a Oficina de Artesanato Miriam Mourão, a partir de convênio firmado entre a Prefeitura e o SEBRAE. Ali perto mora dona Maria Luisa de Carvalho Leite, simpática senhora que é uma verdadeira memória viva do lugar. Ela nos recebeu em sua casa de forma hospitaleira e contou várias passagens da história recente de Pedro II, a maior parte delas enfeixada num livro de sua lavra, Memórias da Minha Terra. Ela começou a escrever depois que se casou, aos 17 anos. Nascida em 1932, dona Maria descreve no seu livro fatos ligados à política, faz referência aos primeiros médicos da cidade, lembrando parteiras e ensinando mesinhas, mergulhando num tempo em que a cidade ainda não tinha energia elétrica. No seu livro, dona Maria se refere ao garimpo de Opala do Boi Morto, segundo ela o maior do mundo, localizado a 5 km do centro da cidade.

O FILÃO DA OPALA

Essa mina foi explorada pela primeira vez em 1958 por seu Mundote Galvão, uma das maiores referências de Pedro II. Dali, ele extraiu a segunda maior opala do mundo, com peso de 4,750 kg, e que hoje se encontra exposta no Museu de História Natural de Londres. Com o destino traçado pela opala, seu Mundote se refere ao ofício com paixão: “tenho fé na pedra, tô trabalhando em cartório porque estou mas gosto mesmo é de pedra; meu negócio é a opala, foi o que me deu vida e sustentou minha família. Minha luta foi grande, mas acho bom gastar o dinheiro que ganho com opala, não adianta a gente viver se privando da vida, tem que gastar o dinheiro. Quem garimpa ganha o dinheiro que Deus dá, então a gente tem que gastar esse dinheiro, viver; eu não me troco por nehum homem de 50 anos. Já estou com 83 anos e a minha base é 100 anos, eu gosto do garimpo, é a minha vida”. Pelo que se verifica na cidade, o negócio da opala também representa a vida para muita gente em todo o município.

Na empresa Opalas Pedro II, pertencente ao senhor Juscelino, funciona uma bem estruturada oficina de lapidação da pedra, que passa por vários processos até se transformar em jóia, unida à prata e, mais recentemente, ao ouro. São peças magníficas forjadas por uma equipe de 20 funcionários, dentre os quais 15 artífices, a maioria jovens. Segundo Adriana Pereira, gerente de produção da empresa, “aqui nós já dominamos todo o processo, fundimos a prata, fazemos a redução da mesma para ela ficar mais resistente, facilitando a moldagem e a montagem das jóias com as opalas, que já foram lapidadas anteriormente, até que seja feito o acabamento final”. São pingentes, brincos, pulseiras, dentre tantos outros produtos. As peças produzidas ali participam de feiras internacionais, como a de Tucson, nos EUA. Os empresários da cidade já se encontram organizados por meio da Associação de Joalheiros e Lapidários de Pedro II – AJOLP, e as peças estão sendo comercializadas em todo o país, e até exportadas. No município, foi criado há 5 anos um Arranjo Produtivo Local da opala, o que forneceu agregação de valor ao proaduto, profissionalizando ainda mais o ramo, com o apoio do SEBRAE.

Embora a extração da opala seja um atrativo à parte no município, o negócio não brilha para todos. Essa é a visão do escritor Ernâni Getirana, professor, escritor, poeta e ambientalista, dentre outros atributos. Autor, dentre outras obras, de Lendas da Cidade de Pedro II (1999), Estripulias de Rosa Doida (2003) e Poemas na Pele (2004), Getirana tem inédito um estudo crítico sobre o garimpo, uma dissertação de mestrado na qual revela sua acuidade analítica sobre os excluídos, trabalho que batizou de “Bamburristas da Terra da Opala: Identidade sociocultural e os desafios frente a políticas de inserção produtiva em Pedro II”. Segundo o escritor, “meu trabalho tira as pessoas do anonimato, mostra a realidade da questão do garimpo a partir do capitalismo, no qual os excluídos representam uma das pontas da cadeia produtiva, mas ficam com a menor parte do bolo; os lapidadores usufruem de 70% do lucro da atividade”. Além do aspecto social colocado em xeque na obra do autor, ainda existe a questão ambiental. Segundo o escritor, 5 milhões de metros cúbicos de dejetos oriundos da dinamitação das pedras repousam numa camada de 30 m de altura, representando impacto ambiental sério.

Uma solução ecologicamente viável, contudo, surgiu a partir da iniciativa de dona Anita Alice Galvão, responsável pela criação do Museu da Roça, criado em 2004, o primeiro museu rural do Piauí, localizado a poucos quilômetros da cidade, no povoado de Roça dos Pereiras. Ali, num casarão erguido em 1899, ela reuniu um valioso acervo no qual se destacam móveis e louças de época, peças sacras, penteadeiras, roupas e objetos usados por vaqueiros, discos de vinil, vitrolas, aparelhos de rádio paleolíticos, fotos e documentos do garimpo da opala. No sítio, funciona um bar e restaurante no qual é servida comida típica. Segundo dona Anita, “sempre gostei de preservar as coisas da família; quando voltei para esta área, que era um garimpo no qual meu pai trabalhava, resolvi cuidar da natureza do lugar e ir guardando coisas antigas, foi assim que surgiu o museu. No momento, já estamos nos estruturando para criar chalés neste espaço, pois já existe grande procura para hospedagem”. No período de 25 de dezembro do ano passado até o dia 5 de janeiro deste ano, o museu registrou a presença de 1.600 visitantes, sendo que a frequencia mensal é de 350 visitantes ao mês.

ECOTURISMO

No retorno do museu, vale a pena dar uma paradinha na Capela de Santa Maria Alves, uma alma (santa popular), que teria morrido de sede no local, vinda como retirante do Ceará. Milagreira, ali se encontra uma grande quantidade de ex-votos. Milagre por milagre, a visão da Cachoeira do Salto Liso é um colírio para os olhos e um bálsamo para o espírito. A 14 km do centro de Pedro II, atinge-se o povoado de Mangabeira. Dali, mais dois 2 km a pé numa trilha de mata mista, com um bioma que mescla espécimes da Caatinga, Cerrado, Cocais e Mata Atlântica, e a cachoeira se descortina. São 26 metros de uma queda d’água esplendorosa, ao final da qual se forma um lago de águas gélidas, um convite permanente ao prazer de um banho relaxante. Na caminhada, a presença de um guia competente, Cleandro Oliveira, integrante da Associação de Condutores de Turistas e Visitantes de Pedro II – ACONTUR, que realiza ainda trabalho de fiscalização e conscientização ambiental junto aos moradores e visitantes.

A partir da cachoeira, retorna-se de carro até uma bifurcação na estrada, e com mais 7 km de estrada de boa piçarra atinge-se o Morro do Gritador, no qual se atinge a borda de um paredão com uma altura de 280 m. Lá embaixo, vislumbra-se o povoado de Caranguejo. O morro é um talhado na Serra dos Matões, prolongamento da Serra da Ibiapaba. A visão é paradisíaca, e no Mirante o visitante pode saborear uma agradável comida caseira.

De vez em quando, uma neblina cobre a paisagem com seu manto lácteo, testemunha do agradável clima serrano de Pedro II. Essa temperatura convidativa só esquenta um pouco quando se realiza no município o Festival de Inverno, que atrai para a cidade aficcionados do jazz e do blues. “No ano passado, o evento, que surgiu em 2004, trouxe para cá 16 mil pessoas. Estamos trabalhando para melhorar cada vez mais a infra-estrutura da cidade para receber os turistas, apresentando sempre, durante o festival, uma programação de alto nível; os moradores são incluídos no processo, e hospedam os turistas, o que gera renda e movimenta o comércio local”, explica a competente Secretária de Turismo de Pedro II, Virna Galvão. Além dos atrativos naturais e artísticos, destaca-se ainda a presença de um rico potencial arqueológico no município; são mais de 80 sítios já localizados, mais uma importante atração turística para um lugar aprazível que apresenta no cardápio, além da comida tradicional, a hospitalidade como um de seus pratos mais refinados.

(Copiado de: http://www.jornalpequeno.com.br/2009/3/12/Pagina101234.htm)
http://getirana.blogspot.com

Um comentário:

Felipe disse...

OI minha dica é ir pra Praia do Rosa no inverno tambem visitar as Baleias Francas que ficam amamentando seus filhotes em torno de julho a outubro , reservas de pousadas e casas podem entrar no Poral http://www.praiadorosa.blog.br.
Valeu pessoal boas fotos.